Meninas do papá

É no mínimo curioso que nunca ninguém tenha ouvido falar no pai da Cinderela, um fulano que deixou a desgraçada da filha nas garras da madrasta malvada e das duas meias-irmãs e pôs-se a andar para ir fazer sabe-se lá o quê, um pai como deve ser teria dito à mulher «ou tratas bem a minha filha ou ponho-te os patins», e o pai da Branca de Neve é outro que tal, como é possível que o tipo não soubesse o que a mulher andava a fazer, será que não sabia que a bruxa queria era limpar o sebo à garota, estaria assim tão cego pela mulher — sim, a madrasta da Branca de Neve era bonita, ao contrário do que o Walt Disney quis fazer crer —, dizia eu que estaria assim tão enfeitiçado pela beleza dela que não via as maldades que ela era capaz de fazer?, e o pai da Bela era outro que tal, que permitiu que o Monstro lhe ficasse com a filha para salvar a própria pele, o cobarde, enfim, estes pais dos contos de fadas saíram-me uns belos de uns palermas a permitirem que as filhas fossem maltratadas, massacradas, quase assassinadas — a troco de quê? —, e o engraçado disto é que estes contos foram adaptados por homens, os Grimm, o Perrault e outros que tais, adaptados de histórias que já existiam nos folclores de vários países, seria de esperar que como foram homens poderiam ter embelezado as coisas, tipo transformar um cobardolas que morre de medo da mulher num cavaleiro corajoso, mas não, não se deram a esse trabalho, e já agora onde anda o pai da Capuchinho, será que a miúda era órfã ou que quando apareceu o lobo o pai se escondeu debaixo da mesa a tremer de medo, e é pena que na altura não existisse nenhuma comissão de protecção de menores ou algo do género para proteger a Cinderela, a Branca e a Bela — bom, hoje existe e por vezes também não fazem nada — que pudesse arrancar as miúdas à guarda desses pais negligentes, enfim, mas vá lá que tudo acabou por se resolver e bem, apareceu o Príncipe e salvou a Cinderela e a Branca de Neve, e o Monstro transformou-se num quando o encantamento foi quebrado — e a Diana Spencer também deve ter esperado que o Carlos se transformasse mas não, coitada — e depois viveram felizes para sempre, dizem eles, e resta saber é se quando as jovens rainhas tiveram as respectivas criancinhas, se os Príncipes lhes mudavam as fraldas e os levavam a passear e brincaram com eles ou se fizeram como os desnaturados dos avôs, mas pronto, disso também ninguém fala.
20/08/2009

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