Bonito de ver

Há uns anos largos, ao vir da estação da CP da Cruz Quebrada a um domingo à tarde e a passar em cima da pontezinha sobre o Jamor para começar a subir a Estrada da Costa, reparei num casal de velhotes que estavam lá sentados num dos banquinhos que por lá havia, e recordo-me de por instantes ter ficado espantada com o cenário. Ambos de cabeças completamente brancas, ele nos sítios onde ainda tinha cabelo e ela com uma permanente irreprensível, ele de fato cor de café com leite, ela de vestido de malha clarinho e florido e sapatos de salto alto, ali os dois sentados, de mão dada, com os olhos mergulhados um no outro, como se não existisse mais ninguém no mundo, muito menos a rapariga que estava a olhar para eles fixamente do outro lado da estrada, e apesar de estar longe consegui ver a expressão de adoração nos olhos deles, aquela adoração de duas pessoas que viveram mais do que uma vida inteira juntos e que ainda assim cada dia sabe a pouco, querem mais, a cada dia que passa o amor aumenta, e a certa altura beijaram-se, como o casal apaixonado que efectivamente eram, e nunca me esqueci daquela cena, decerto já teriam netos, ou quem sabe bisnetos, e estavam ali aos beijos e arrulhar meiguices um ao outro como um casal de jovens com a vida inteira pela frente, e aquela imagem fez-me sonhar, ficou-me na cabeça como uma versão deturpada de O Beijo do Henri Cartier-Bresson, mas igualmente bela, um sinal de que o amor e a paixão não são coisas de velhos.

30/06/2009
A ouvir: Shine, Depeche Mode

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